CRÔNICA SOCIAL
... Perfeito, perfeito, perfeito, o almoço. Poderia ser transportado na íntegra ― mesa, comensais, comida, garçons ― para outra casa, quiçá outro país, como se diz de obra de arte (que não conhece fronteiras). E a consciência de que é de cada um que depende a falta de erro. Reunião é uma reunião em torno de uma gafe que não é cometida? A tensão da perfeição crescendo, a pele do tambor esticando-se. Risco excitante. Para cada um, a gafe que não é cometida. Que gafe, afinal? Eu. Cada um é a própria gafe muda. Que sob o sorriso de sonho atrai, atrai, atrai sádica, estou chegando perto, numa sorridente tortura de pesadelo. Mais um minuto, mais um instante ― e ― e eu acontece. Entre o conhaque e a fumaça, a perfeição esticada cada vez mais tênue. Esporte perigoso, esse.
Clarice Lispector. Para não esquecer: crônicas. Rio de Janeiro: Rocco, 1999, p.66-67.
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