Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sábado, 16 de outubro de 2010

"Quando Fui Outro" - Fernando Pessoa


O que mais surpreende em Quando fui outro, antologia de poesia e prosa de Fernando Pessoa organizada por Luiz Ruffato, é o contraste entre a capa e a melancolia que compõe o volume. Falar de melancolia em Fernando Pessoa é praticamente uma redundância, mas não há termo que quadre melhor, numa pincelada rápida. Abre a coletânea, salvo engano, "Tabacaria", um dos poemas mais desconcertantes de Álvaro de Campos, poema que provoca uma leitura do assombro, do espanto, do impossível. A seleção de Luiz Ruffato foi bem cuidadosa, a edição está caprichada, trata-se de um livro bonito, em muitos sentidos. Se isso não fosse um truísmo, diria que há em Fernando Pessoa uma densidade que o discurso não comporta, e que isso diz muito de certas questões referentes à poesia moderna. Mas a capa, acenando com uma alegria... quem é esse outro, que desejou ser amado? Talvez o mesmo de quem jorrou uma poesia que torna impossível não amar, poesia e poeta. Segue o link da pesquisa buscapé para o livro (aqui). 

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