Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 10 de outubro de 2010

duas crônicas lidas em manuais escolares

Uma das crônicas relatava a situação de um sujeito entrando numa loja, dessas que vendiam de tudo (mas anteriores ao fenômeno 1,99), para comprar um objeto de cujo nome ele não se lembrava. Então era curioso o contorcionismo, o verdadeiro malabarismo mental que ele fazia para o vendedor tentando explicar o que queria, enquanto o vendedor ia oferecendo possibilidades, soluções, ou seja, nomes que poderiam equivaler ao objeto. E a crônica era muito bem pensada, pois realmente não dava para atinar que se tratava de um... Me ocorreu, vagamente, que sem as palavras fica mesmo difícil lidar com as coisas. A outra crônica também tinha como cenário uma loja, um comprador e um vendedor. Este, um pouco desligado da vida, está em busca de um aparelho de televisão, e aí o vendedor se apressa em mostrar as muitas qualidades de um televisor que se encontrava ligado, e em torno do qual estava reunido um grupo expressivo de pessoas, um tanto quanto agitadas. O vendedor começa a explorar isso, as diferentes emoções manifestadas diante do televisor, esmera-se nos detalhes, enaltecendo o poder do aparelho (tratava-se de fato de um comprador ingênuo e um vendedor esperto, mas portando uma certa malícia que deu lugar a formas mais agressivas de persuasão), e acaba convencendo o comprador. Só que se tratava de um jogo de copa do mundo, não sei se final, Brasil e qualquer coisa, e o comprador se encaminha ingenuamente, por sugestão do vendedor, em direção ao aparelho para desligá-lo e levá-lo para casa.

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