Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Gottfried Benn: “Problemas da lírica” (excertos)

“A nova poesia ― a lírica ― é um produto artístico que envolve uma característica de cumplicidade, de controle crítico e ― para usar uma expressão perigosa ― o conceito do artístico. Na composição de uma poesia, não consideramos apenas a poesia, mas também o seu autor. Neste sentido é particularmente significativa a posição de Valéry, para quem a contemporaneidade do fato poético com aquele crítico-introspectivo atinge o seu limite onde os dois lados se interpenetram e se fundem. Aliás, ele afirma: ‘Por que não devemos começar a considerar como obra de arte a própria construção da obra de arte?’ Neste ponto nos defrontamos com uma particularidade significativa do atual Eu lírico. Na literatura moderna encontramos diversos exemplos de poderes que se equivalem num determinado autor, das suas qualidades líricas e ensaísticas. [...] Os líricos modernos nos apresentam uma filosofia da composição e uma sistemática da criação.”

BENN, Gottfried. Problemas da lírica. Trad. Fábio Weintraub. Rio de Janeiro, Cadernos Rioarte, Ano I, n.3, p.4-11, 1985. Conferência proferida em 1951. 

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