Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

escrita, rigor, necessidade e outras contingências

Antes mesmo de começar a escrever, mas já com a ideia e o título em mente, tropeço neste post falando de algo similar (e de forma bem mais concisa), a questão de uma auto-censura à escrita. Então cito, além da coincidência, para não parecer plágio de ideias: a césar o que lhe pertence. Feita essa ponderação, começo por dizer que falei da questão, a minha, a um amigo, no sentido de que de repente estava renegando textos já escritos e postados, e que isso eu atribuía a um excesso de rigor de minha parte quanto ao que escrevo. Ele me disse coisas que considero pertinentes, considerando os dois lados, de quem escreve e de quem lê: "Penso que as duas coisas movimentem nossa preocupação com a escrita: um rigor por parte de quem escreve [...] e preocupação com o leitor (mesmo que ninguém leia o que escrevemos sempre que, movidos pela necessidade da escrita, traçamos linhas é porque temos algo interessante a dizer)." Nesta segunda parte, me parece, está o essencial. Garantida a qualidade da escrita (que pode ser sempre questionável), é importante reconhecer que a preocupação com o leitor pode ser um fator limitante. De fato, a compulsão que sinto por escrever é tal que submetê-la a um controle excessivo, além daquele que já exerço (e vale relembrar o trecho do Graciliano Ramos aqui postado) é torturante, de forma que ou obedeço ao impulso quando ele se impõe e escrevo (mesmo que fique amassando o texto por dias num rascunho), ou desisto e fecho o blog. Se traço linhas é porque julgo ter algo interessante a dizer, ainda que seja a mim mesma. E é melhor postar antes que fique pensando muito e acabe por desistir. As ditas celebridades, no Brasil, publicam com extrema facilidade, as portas das grandes editoras estão lhes sempre abertas. Enquanto isso, minha dissertação de mestrado, tratando tema original, está aqui guardada, pois julgo que sem uma revisão ela não é publicável (se é que vou encontrar editora com boa vontade para tanto, sem pagar do próprio bolso). Os meus melhores textos foram aqueles em que obedeci, a fundo, minha necessidade de escrever. O melhor, para mim, ainda é o Edital de Incineração. Foi a partir dele que o torvelinho da escrita se pôs em movimento, para o bem e para o mal. De todo modo, ele está lá no início de fevereiro de 2010, e de maneira geral meus textos de março para trás não me agradam muito, prefiro nem relê-los, e as razões para tal seriam já assunto de outro post (são difíceis, demandam elaboração, mas guardam relação muito forte com certas transformações por que passei e que vi plasmadas na minha escrita). Fica a advertência: se alguém eventualmente for ler algum desses textos mais antigos, poderá achar que se trata, talvez, de uma outra Mariana. 

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