A LUZ
Se nunca a um cego nato alguém falasse
As palavras cegueira, ou vista, ou cor,
E do mundo a feição falsificasse
De um modo em que normal fosse o negror,
E das artes do ser só lhe ensinasse
As que as trevas têm forças de compor,
De forma que o universo aparentasse
Ser lógico no escuro esmagador,
Este cego, educado em outra história
Sem pintores, sem astros e sem glória,
Forjada em mãos e sons, mesquinha, aqui,
Um dia, a colher ervas, preso à estrada,
Sentiria em seus olhos mais que o nada,
E o horror de algo que falta. Igual a ti.
BUENO, Alexei. As escadas da torre. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003, p.143-144.
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