Com quantos hojes se faz um blog? Uma vida? Hoje foi um dia em que seria bom des-existir, o que não é o mesmo que desistir, porque mesmo no desejo de desexistir há uma presença, uma insistência, alguém que deseja desinvestir um pouco a carga das certezas. Hoje todos os poemas de Alberto Caeiro me serviriam, porque estou cansada de pensar, tenho pensado demais, pensado sempre, pensado já como um vício adquirido. E nesse excesso de pensar uma vida se gasta. Um jeito de pensar menos ― esquecer. Isso, o des-existir. Porque há um concerto maior, enquanto o meu pensamento é tão mesquinho. Eu quero a arte que cura do pensamento. Des-existir na automação da existência para, quem sabe, conseguir um modo de existir. As crianças que brincam em mim trazem notícias remotas de que toda palavra guarda uma cilada. A partir de certo ponto qualquer um está se comprometendo com o que diz, no sentido de que é impossível recuar ao estado originário em que a linguagem era, era o quê? Era a suspeita, apenas, de que um dia eu poderia pertencer ao mundo, e o mundo me pertencer. Todo mundo foi à festa. A frase mais antiga de que me recordo ter lido, num jornal de embrulho. Todo mundo? Mas cabia todo mundo numa festa? ― perguntava-se então a criança incauta, mas já, na frase, indo à festa com todo mundo. Porque esta frase, desde então, eu tomei para mim: a festa do mundo eu não poderia perder. Não posso.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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