Minha preguiça de sair de casa anda imbatível. Ocorre que liguei para uma amiga, buscando solução para fugir de um programa pouco convidativo. Ela disse que teria hoje um queijos e vinhos com um pessoal conhecido dela, e comentou en passant que se intitulam “do lado de cá”, me convidando. Basta morar no Rio de Janeiro para saber o que é este lado de cá. Então eu, que moro em Jacaresilvânia (homenagem ao belo Castelo dos Vinhos que abre minha rua), sou bem lado de cá, à esquerda da esquerda, quase já um outro lado do lado de cá, que é de lá. E se me conheço bem, embora tenha combinado quase cem por cento certeza, não vou ao queijos e vinhos. É que o canto que me calhou morar no Rio de Janeiro é tão bom (sequer lembra a cidade que vive aparecendo na televisão, nos seus extremos, Leblon e Alemão) que veio perfeitamente ao encontro de minha fome de ler e escrever, de simplesmente estar em casa, maior, certamente, que a vontade de sair, pelo menos por enquanto. Porque quando a pessoa se descobre de posse de alguma coisa muito boa é difícil trocá-la por outra, ainda que pessoas incríveis possam estar à espera. Dizer mais do que isso é desnecessário. Apenas isto, então: minha nova casa deu-me algo que já tive algumas vezes, sem saber que tinha, e que por isso voltava a perder: uma espécie de limite para a rua.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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