Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 31 de agosto de 2017

degradação

Tenho um perfil mais ou menos consolidado na profissão docente, uma espécie de respeito associado ao bom convívio com os/as estudantes e os/as colegas de profissão. Pois bem. Ontem uma estudante da 3ª série do ensino médio conseguiu se superar. Venho percebendo o descaso de parte de uma turma de 3ª série com a disciplina de Português e Literatura, no retorno das aulas após o recesso do meio do ano. Ontem decidi não esperar mais e coloquei a roda para girar. Uma estudante continuou no pátio, depois de me ver subindo para a turma, enquanto alguns outros estavam simplesmente à deriva, numa postura que vem se repetindo nas últimas semanas. Quando retornei da sala para mandar um grupo de atrasados à bedelaria, a estudante lançou mão de alguns argumentos curiosos. Um deles foi sintomático da crise que atravessa o Brasil: Mas minha mochila está na sala, professora. Numa semana em que discuti o poema “O cacto” de Manuel Bandeira, paralelamente à presença dessa estranha forma de vida na pintura modernista brasileira, uma estudante me diz que tem coisas mais importantes a fazer do que assistir à aula, e pede que eu seja compreensiva, pois, afinal, sua mochila está na sala.