Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sábado, 7 de novembro de 2015

um pais sem alma

“Há sempre um copo de mar / para um homem navegar” ― disse o poeta. Por que nós, achados por outro navegantes, nos esquecemos tão depressa do mar? Estamos afundando na lama, mais real que nossas piores alucinações coletivas. Enquanto isso, o nobre deputado vai na televisão dizer que nada é o que parece ser. Meu Deus! Até quando suportaremos?

"theres too much confusion" (no país cujos fora-da-lei dão entrevistas-farsa para o principal canal de televisão)

infelizmente aqui a política parece inseparável da corrupção

terça-feira, 3 de novembro de 2015

o ciclo da natureza

Ontem foi dia dos mortos. Saí para a caminhada habitual, a recomendada pelos médicos, de fim de tarde. A chuva (também) habitual da data começou enfim a cair, no momento em que saía. Sendo pouca, prossegui. Mas logo engrossou, assumiu ares de chuva de finados. Não recuei. Ao contrário, deixei que a chuva me lavasse e quem sabe levasse um pouco da ansiedade, da respiração opressa. Já quando retornava, quase chegando em casa, me dei conta de que aquela mesma chuva estará um dia encharcando o chão onde estarei enterrada. E senti um enorme sufoco, uma falta de ar, e desejei viver, continuar vivendo, simplesmente, por muito tempo, enquanto a mim isso for concedido. 

Ah!

Procurei uma palavra sob que me proteger. Pensei na palavra paz. Mas logo percebi o engodo. A palavra paz não protege, não guarda ninguém. Ela é pequena demais para isso, escudo impróprio, e tem no centro um enorme a, vogal aberta, vazada, que a tudo dá passagem.