Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sábado, 26 de abril de 2014

boa companhia

eu!?

Tenho momentos de extrema fragilidade, em que parece que vou desintegrar, que o eu que construí para uso externo e contínuo vai ceder à emergência de forças disciplinarmente mantidas sob controle, sob vigilância atenta. Entrevejo outros eus, passados e presentes, e pressinto que a casca frágil da superfície pode facilmente rebentar. Meus recursos nesses momentos? Escrever, por exemplo. Outros são de foro íntimo.

quarta-feira, 23 de abril de 2014

Murilo Mendes

JUÍZO FINAL DOS OLHOS

Teus olhos vão ser julgados
Com clemência bem menor
Do que o resto do teu corpo.
Teus olhos pousaram demais
Nos seios e nos quadris,
Eles pousaram de menos
Nos outros olhos que existem
Aqui neste mundo de Deus.
Eles pousaram bem pouco
Nas mãos dos pobres daqui
E nos corpos dos doentes.
Teus olhos irão sofrer
Mais que o resto do teu corpo:
Eles não poderão ver
As criaturas mais puras
Que no outro mundo se vê.

MENDES, Murilo. Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994, p.205.

poesia

“Devo aos poetas de todos os tempos a sobrevivência de minha alma. [...] A Baudelaire, em cujo túmulo depositei uma rosa, a fulgurância do raciocínio, a elegância corrosiva de seu sentimento trágico; a Shakespeare, a iniciação a todas formas humanas [...]. A Pablo Picasso, a reacomodação do nervo óptico.”

Paulo Mendes Campos. Cisne de feltro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001, p.18.

desolation row

dentro da ordem (e do progresso)

terça-feira, 22 de abril de 2014

para ouvir no táxi

imagens de são paulo (5)

imagens de são paulo (4)

imagens de são paulo (3)

imagens de são paulo (2)

imagens de são paulo (1)

Paulo Henriques Britto: "Nem tudo que fui se aproveita"

QUEIMA DE ARQUIVO

Houve um tempo em que eu amava
em cada corpo o reflexo
do que eu queria ter sido.
No fundo do sexo eu buscava
o meu desejo perdido.

Acabei achando o outro
que em mim mesmo destruí.
Foi fácil reconhecê-lo:
de tudo que vi em seu rosto
somente o ódio era belo.

Esse morto adolescente
implacável e virginal
não me perdoa a desfeita.
Não faz mal. Eu sigo em frente.
Nem tudo que fui se aproveita. 

Paulo Henriques Britto. Mínima lírica. 2.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2013, p.80.

uma imagem do museu do futebol (sp)

lou reed - "foot of pride"

manuel, o audaz

segunda-feira, 21 de abril de 2014

páscoa

Tive uma páscoa maravilhosa, sem precisar de chocolate — e sem precisar lembrar que era páscoa.