Amanhã uma diarista virá a minha casa fazer parte do
trabalho invisível que me mantém visível ― considerando o restrito mundo em que
me movimento. Na terça, nada desandando, serei ouvida, por uma hora ― provavelmente
menos, porque não aguento ― por uma analista que, por enquanto, tem
garantido... o que exatamente? Não sei. Toda vez que tenho ganas de deixar a
análise sinto o desamparo tomar conta e percebo que, se não ir lá falar, posso
comprometer um delicado equilíbrio psíquico que construí após a queda da última
fronteira que representava minha resistência, meu forte. Até os 40 desbravei sem medo tudo o que apareceu. Eu era mais eu. Depois,
alguma coisa se quebrou nessa confiança inabalável, e pela primeira vez eu
precisei admitir que não continuaria dando conta apenas com a fortaleza que
construí na juventude. Por isso, quando vêm com essa história de “bela, recatada e do lar”, eu digo, ok, meu irmão, todos sabemos
exatamente com quantos Rivotril se faz uma bela ― capaz de encarar
as necessidades da fera. Pobre Marcela. Traidora como o ditoso cônjuge. Para as que continuam lutando, um sol de primavera.
Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.
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