Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Graciliano Ramos e a renovação modernista da linguagem

Trecho de entrevista concedida por Graciliano Ramos a Homero Senna, em 1944:


H S – Sabe que é apontado como um dos nossos escritores modernos que melhor manejam o idioma?
G R Conversa. Talvez, se houvesse alguma verdade nisso, eu devesse muito aos caboclos do Nordeste, que falam bem. É lá que a língua se conserva mais pura. Num caso de sintaxe de regência, por exemplo, entre a linguagem de um doutor e a de um caboclo, não tenha dúvida, vá pelo caboclo, e não erra. Note que me refiro ao caboclo do sertão. O do litoral vai-se estrangeirando...

H S – Mas não venha me dizer que seu aprendizado da língua se fez apenas com os caboclos de Buíque e Palmeira dos Índios?
G R – Claro que não... Muitas coisas não poderiam eles ensinar-me. Está visto que tive de chatear-me lendo gramáticas.

SENNA, Homero. República das letras. Entrevista com 20 grandes escritores brasileiros. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996, p. 206.

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