Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

barton fink: delírios de hollywood

Barton Fink é das melhores coisas dos irmãos Coen que já vi. Passei a prestar atenção no cinema deles casualmente, vendo filmes em cartaz: o poderoso Onde os fracos não têm vez e o kafkiano Um homem sério. Então comecei a me situar, e assisti ao ótimo Queime depois de ler, ao excelente The Big Lebowski, ao razoável Bravura Indômita, ao mediano Fargo, sem contar o humor negro de Matadores de velhinha. Foi antes de Bravura Indômita que assisti a Barton Fink, e talvez essa sequência tenha desfavorecido o segundo filme. Barton Fink mira a própria indústria cinematográfica, com uma acuidade que eu diria única. A dupla que faz a roda do filme girar, o roteirista recém-chegado a Hollywood, Barton, e o homem comum e seu vizinho de quarto, Charlie, protagoniza diálogos repletos de desamparo e humor autoirônico. Barton, ao mesmo tempo em que é o artista-intelectual que pretende falar do homem comum, sem conseguir reconhecê-lo ou ouvi-lo, inspira no espectador uma empatia advinda da verdade de seu sofrimento, e de sua intenção, aparentemente genuína, de esnobar os intelectuais. Quanto a Charlie, é um verdadeiro enigma. Agora é aguardar Inside Llewyn Davis.

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