Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 10 de junho de 2011

Rainer Maria Rilke: Sonetos a Orfeu

II,1

Respirar, invisível dom ― poesia!
Permutação entre o espaço infinito
e o ser. Pura harmonia
onde em ritmos me habito.

Única onda, onde me assumo
mar, sucessivamente transformado.
De todos os possíveis mares ― sumo.
Espaço conquistado.

Quantas dessas estâncias dos espaços
estavam já em mim. E quanta brisa
como um filho em meus braços.

Me reconheces, ar, nas tuas velhas lavras?
Outrora casca lisa,
céu e folhagem das minhas palavras.

RILKE, Rainer Maria. Coisas e anjos de Rilke. Trad. Augusto de Campos. São Paulo: Perspectiva, 2007, p.157.

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