Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

as armas secretas

As armas secretas, de Julio Cortázar, é simplesmente imperdível, sendo mesmo difícil escolher dentre os cinco contos o melhor ― todos primam pela excelência. Depois de assistir a Blow up, “As babas do diabo” ganha uma densidade imagética única, sem contar que se trata de um pequeno tratado sobre o olhar. “O perseguidor” é implacável e “Cartas de mamãe” é magistral, talvez pela coincidência de tê-lo lido durante uma viagem. Um pequeno senão à tradução (ou quem sabe à revisão): não obstante os elogios, há problemas que, mais uma vez, fazem lembrar como a pressa editorial compromete a qualidade de um trabalho que deveria primar por aquilo que persegue: o cuidado com o que Johnny tenta lembrar a Bruno, seu biógrafo, o tempo todo, e que felizmente não escapa ao narrador-perseguidor, colado a Bruno: "― Não se pode dizer nada, que imediatamente você traduz para o seu idioma sujo. Se quando eu toco você vê os anjos, a culpa não é minha. E o pior, o que você verdadeiramente esqueceu de dizer no livro, Bruno, é que eu não valho nada, que o que eu toco e as pessoas aplaudem não vale nada, realmente não vale nada." (p.147). 

CORTÁZAR, Julio. As armas secretas. Trad. Eric Nepomuceno. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010. Mais detalhes no blog meia palavra.

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