Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 29 de janeiro de 2012

Jorge de Lima: Livro de Sonetos

E que grande paz neste oceano de hoje.
Que íris, que amizade continente.
Entre nereida e anêmona não se ouve
a linguagem que afasta gente de gente.

Entre quem dorme aqui e no outro pólo houve
uma comunidade permanente.
Os contemplados e serenos rostos
olham-se com um olhar preexistente.

Um candelabro em pêndulo constante
ritma a sina dos cabos bojadores.
E são âncoras na água em maré cheia,

e são bússolas de um igual instante
marcando calmarias e torpores,
e marujos parados de alma alheia.


Jorge de Lima. Poemas negros. Rio de Janeiro: Record, 2007, p.188.

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