Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 10 de fevereiro de 2013

do tamanho do meu coração

O programa ontem era ir ao cinema com a amiga. Das muitas opções em cartaz, escolhemos Django, pelo quesito “onde está passando” e mais os óbvios motivos. Django me atarantou, me deixou tonta, me obrigou a esconder o rosto em mais de uma cena de violência. Um filme terrível, não importa se se conheçam ou não as referências com que o diretor está dialogando. Talvez por isso eu tenha amanhecido hoje mal, fisicamente, espirrando, com uma virose nauseante que foi ganhando força ao longo do dia. Não foi uma boa pedida, ainda mais que minha amiga quis se sentar nas fileiras da frente, a tela era imensa, me obrigando a malabarismos para captar a legenda e a cena. Felizmente houve outra cena, quando entrava no shopping. Um monge, trajado a caráter, vendia alguns livrinhos, e se acercou de mim. Perguntou-me se eu era daqui ou de fora. Disse-lhe que todos nós somos de fora, com o que ele concordou. Mas insistiu na pergunta e eu disse que não era do Rio mas morava aqui. Então escolhi um dos quatro livrinhos e perguntei quanto era. Ele disse que eu poderia dar uma contribuição. “Quanto?” “Do tamanho do seu coração.”  Eu ri e disse que assim ficava difícil, porque não sei estimar o tamanho do meu coração ― menos ainda ali na pressa: estava sol, e eu queria entrar logo, para mais uma viagem capitalista àquele templo do consumo. Saquei da carteira uma importância que não desmerecesse o tamanho do meu coração, mas fiquei desconfiando que ele é instável, mesquinho, depende do outro coração que está frente a mim. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário