Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 5 de setembro de 2010

retalhos de conversa

Tenho uma capacidade incrível de ouvir retalhos de conversa, aquilo que é dito en passant, que não é de forma alguma o miolo que está movimentando a roda. Numa dessas rodas, alguém relatou a fala de um terceiro, um homem, que disse mais ou menos isso de seus vários, e simultâneos, affairs (termo educado para rolo): "se juntar todas não dá uma". Esqueceram de lhe contar que também ele talvez nem seja "um", ou quem sabe nenhum (como aliás qualquer um de nós, habitantes anônimos de nós mesmos)? E que por isso não consiga enxergar nenhuma, nem uma mulher... E aí eu, em parte, estou respondendo às divagações que meu amigo Luigi fez num post anterior, "desenredo" (link aqui), acerca de um conto conhecido do Rosa. Mas como gosto muito de pensar nessas coisas, e respeito muito meus eventuais interlocutores — afinal eles estão tendo a paciência de me ler e me ouvir —, prometo escrever algo mais educado sobre a questão, até porque o conto do Rosa é muito instigante — tanto este como um outro, aqui aludido en passant: "Nenhum, Nenhuma". E não deixa de ser interessante pensar que cada um dos posts daqui, ou de qualquer outro lugar, também constitua um retalho de conversa, com comentários que ficam ressoando (ou constituem "ressonâncias", como quer meu amigo Luigi), ficam ressoando e acabam gerando novos retalhos. Com eles se faz uma colcha? Não sei, mas certamente se faz um retalho de escrita. 

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