Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Kafka: aforismos

Diz um aforismo de Kafka, facilmente encontrável na net, ao contrário do livro em que foi publicado, infelizmente: "A partir de certo ponto não há mais qualquer possibilidade de retorno. É exatamente esse o ponto que devemos alcançar." O aforismo aparentemente aconselha o contrário da prudência, embora outros da mesma lavra caminhem nesta direção. Nunca há retorno, para nada, isso é ilusão, todas as ações trazem consequência, mesmo não escolher é escolher. Então o aforismo talvez sinalize que simplesmente cada passo é um passo em direção ao novo, ao desconhecido, impossível de ser desfeito. Nada pode ser desfeito, mas ao mesmo tempo não é possível prescindir de fazer: este parece ser o seu sentido. O que fazer, então? Às vezes, nada. E certamente o mais desconcertante dos aforismos que li foi este: “Há dois pecados capitais, de que derivam todos os outros: a impaciência e a preguiça. Devido à impaciência fomos expulsos do Paraíso; devido à preguiça não conseguiremos retornar a ele. Pensando bem, talvez a impaciência seja o mais capital dos pecados: foi por ela que o perdemos, é por ela que não o temos de volta”. Para mais detalhes sobre a obra, segue o link de um comentário inspirado (aqui), de onde extrai os aforismos que cito.

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