Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 5 de dezembro de 2010

Rainer Maria Rilke

A SOLIDÃO

A solidão é como chuva.

Sobe do mar nas tardes em declínio;
das planícies perdidas na saudade
ela se eleva ao céu, que é seu domínio,
para cair do céu sobre a cidade.

Goteja na hora dúbia quando os becos
anseiam longamente pela aurora
quando os amantes se abandonam tristes
com a desilusão que a carne chora;
quando os homens, seus ódios sufocando,
num mesmo leito vão deitar-se: é quando
a solidão com os rios vai passando...

RILKE, Rainer Maria. Poemas. Trad. Geir Campos. São Paulo: Luzes no Asfalto, 2010, p.23. 

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