Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Emily Dickinson: "uma cartilha rara para a vida"

Não ver no Mundo a sua face 
É muito tempo ― até que eu ache
Onde isto ― é tudo só
Uma cartilha ― para a vida ―
Na prateleira ― inatingível ―
Fechada ― para nós ―

Mas a cartilha é o que me basta ―
Livro nenhum ― me fará falta ―
Por mais raro ― o saber ―
Pode alguém ser ― o mais instruído ―
Tomar nas mãos ― o Paraíso ―
Eu só quero ― o ABC ―


Not in this World to see his face ―
Sounds long ― until I read the place
Where this ― is said to me
But just the Primer ― to a life ―
Unopened ― rare ― Upon the Shelf ―
Clasped yet ― to Him ― and Me ―

And yet ― My Primer suits me so
I would not choose ― a Book to know
Than that ― be sweeter wise ―
Might some one else ― so learned ― be ―
And leave me ― just my A-B-C ―
Himself ― could have the Skies ―

DICKINSON, Emily. Alguns poemas. Trad. José Lira. São Paulo: Iluminuras, 2008, p.64-65.

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