Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Mário Faustino: "Entorne-se o mel do tempo: sim, silêncio"

...

Entorne-se o mel do tempo:
sim, silêncio ―
cale-se o marimbondo em seu cortiço:
duro, é duro ―
amanhece e o mundo zumbe, zumbe e zomba
quando não se enfurece com teu grito
pedido de silêncio
ou de suspensão
da pena de estar vivo.
Vivo e oco
vivo e não vivo, ator,
mentiras sussurrando à brisa, Midas.
Corte sem viço: tampa
de nada sobre o vazio povoado
de fontes, parras, nojos ―
tal a morte ―

...

FAUSTINO, Mário. O homem e sua hora e outros poemas. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009, p.102.

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