Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quarta-feira, 1 de junho de 2011

João Cabral de Melo Neto

ANTI-CHAR

Poesia intransitiva,
sem mira e pontaria:
sua luta com a língua acaba
dizendo que a língua diz nada.

É uma luta fantasma,
vazia, contra nada;
não diz a coisa, diz vazio:
nem diz coisas, é balbucio.

MELO NETO, João Cabral. A educação pela pedra e depois. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997, p.72. 

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