Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sábado, 22 de outubro de 2011

numa noite muitas noites

Das imagens desta noite ficou-me mais viva a última (as outras já se perdendo naquela névoa que sobra dos sonhos), eu fazendo uma estranha salada, sem intenção inicial de fazê-la, pois que apenas misturava ingredientes pouco ortodoxos ao conceito de salada que tinham restado próximo a mim, enquanto as outras pessoas saíam para fazer coisas que julgava bem mais interessantes, tanto que me tomava a frustração de não poder ir também. No entreato dos atos fiquei e mexia aquela mistura com cara de nada, nonsense, até que percebi tratar-se de uma salada, ainda que com componentes exóticos e um aspecto de incompletude ― é que quando percebi o que se passava comecei a me empenhar para que aquilo ganhasse a forma que reconhecia, e é claro que as palavras com que dou contorno às imagens do fragmento do sonho são já outra camada dos ingredientes (fragmentos) que misturava, percebendo-lhes uma liga (aliás eles ofereciam mesmo alguma resistência ao movimento), ao mesmo tempo em que a palavra salada é só uma concessão ao que se passava. Assim como a palavra abacate ou lentilha. Com as sobras de vários sonhos dentro do sonho eu estava a fazer uma salada.

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