Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 4 de novembro de 2011

a palavra

Uma garatuja prosaica: acerca de y, x afirmou: Ela não mede o impacto de suas ações na vida das pessoas. Agora o que interessa: a poesia me deu, mais que qualquer outra experiência, um senso agudíssimo do estranho e fascinante poder da palavra. E é tão difícil explicar isso quanto perceber o impacto que uma palavra pronunciada tem ― sobre quem fala e o outro:

Uma palavra se abre
Como um sabre ―
Pode ferir homens armados
Com sílabas de farpa
Depois se cala ―
Mas onde ela caiu
Quem se salvou dirá
No dia do desfile
Que algum Irmão de armas
Parou de respirar.

Aonde vá o sol sem ar ―
Por onde vague o dia ―
Lá está esse assalto mudo ―
Lá, a sua vitória!
Observa o atirador arguto!
O tiro mais perfeito!
O alvo do Tempo
O mais sublime
É um ser “ignoto!”


There is a word
Which bears a sword
Can pierce an armed man ―
It hurls its barbed syllables,
At once is mute again ―
But where it fell
The saved will tell
On patriotic day,
Some epauletted brother
Gave his breath away.

Wherever runs the breathless sun ―
Wherever roams the day ―
There is its noiseless onset ―
There is its victory!
Behold the keenest marksman!
Time's sublimest target
Is a soul "forgot"! 

DICKINSON, Emily. Não sou ninguém: poemas. Trad. Augusto de Campos. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2008, p.20-21.

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