Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


sexta-feira, 27 de maio de 2011

Alexei Bueno

Poesia

Essa se vai
Mas sempre volta,
Nunca nos trai,
Nunca nos solta.

Damos-lhe uns reles
Trapos com prantos
E ela faz deles
Místicos mantos.

Damos-lhe a lama
Da alma, e ela acende
Nisso uma chama
Que a noite entende.

Damos-lhe a finda
Vida, e ela a alça
A outra tão linda
Que a ida faz falsa.

Essa não mente,
Essa não passa,
Mira de frente
Glória ou desgraça.

E quando a Morte
Nos pisa, branda,
Ela diz, forte:
Levanta-te e anda!

BUENO, Alexei. Lucernário. Poesia reunida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003, p.266.

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