Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

The Last King of Scotland (2006)


O último rei da Escócia é um filme sobre muitas coisas. A principal delas, a meu ver, é o modo como a questão da ingenuidade é tratada, melhor dizendo, é um filme sobre a perda da ingenuidade e dos bons sentimentos, aqueles que, na juventude, costumam levar a escolhas cheias de boas intenções e que, conforme o provérbio, não excluem o caminho do inferno. Na pele do ditador da Uganda, Forest Whitaker ganhou o Oscar de melhor ator, e talvez tenha mesmo roubado a cena, mas é no jovem médico escocês que se larga numa aventura totalmente às cegas em direção à África, Nicholas, que se concentra, por assim dizer, a parte dramática da história, no sentido dos conflitos que vão se desenhando na medida em que as evidências começam a falar por si. Nicholas não é só ingênuo: ele acredita na bondade humana. Melhor dizendo: ele vai à África imbuído da melhor tradição humanista, e o que experimenta, por seu humanismo, é o inferno. Rimbaud às avessas, quase não consegue escapar do inferno em que se apanha, condenado a uma morte lenta, torturante e com requintes de crueldade. O ator James McAvoy tem atuação notável como o médico recém-formado que tenta trilhar caminhos próprios. Forest Whitaker desenha com maestria um ditador feroz e sedutor a um só tempo. Imperdível. Seguem os comentários do CinePlayers (aqui) e do Omelete (aqui).

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