Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 23 de junho de 2011

Sebastião Uchoa Leite

PEQUENAS IDEIAS FIXAS

coisas limpas
de ar-condicionado sem pesadelos
escritos rasos
le mot juste
objetos diretos colocados
precisões
do ostinato rigore
lancetas bisturis agulhas
conceitos vermes
"la consciencia me sirve de gusano"
grafitti críticos
"somos o carnaval das multinacionais"
observações ao acaso
"um leão
é feito de carneiros devorados"
do poeta da ideia fixa
coisas secas
escritos de gravetos
greves
inscrições de w.c.
"uma coisa é certa
poeta de privada
vive inspirado na merda"


LEITE, Sebastião Uchoa. Ciranda de poesia. Org. Franklin Alves Dassie. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010, p.66.

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