Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quarta-feira, 5 de outubro de 2011

as letras

“As letras, vejam bem. Que formulação feliz! Letras, reunidas por fios invisíveis tomados por imponderáveis correntes magnéticas. E toda essa azáfama imposta a um cérebro que deveria funcionar impecavelmente, e trabalhar sem ter trabalho. É uma pessoa, vindo na sua direção, ou só uma mente? Uma mente distribuída por livros, páginas, frases repletas de vírgulas, ponto-e-vírgulas, travessões e asteriscos. Um autor conquista um prêmio ou uma cadeira na Academia por seus esforços, ao outro só cabe um osso roído pelos vermes. Os nomes de alguns são dados a ruas e bulevares, os de outros a prisões e asilos. E mesmo depois que todas essas ‘criações’ tiverem sido finalmente lidas e digeridas, os homens ainda estarão atacando uns aos outros. Nenhum escritor, nem mesmo o maior deles, jamais foi capaz de contornar esse fato duro e frio.”

MILLER, Henry. Nexus. Trad. Sergio Flaskman. São Paulo: Companhia das Letras, 2006, p.310. 

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