Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 3 de outubro de 2010

marcadores e a questão dos gêneros na ficção

Quando vou postar algum excerto de literatura que não seja poesia (e falar isso é já uma redundância, pois aponta um recorte, um trecho, e poesia é outra coisa), surge um problema: qual o marcador apropriado? Para "conto" e "crônica" é relativamente fácil. Mas, para "romance", creio que tenho sido bastante desonesta: ora esqueço, ora deliberadamente não coloco. Pois o gênero "romance" é complicado, ou melhor, ficou complicado. Isso deixando de lado a famosa "novela": muito do que hoje chamamos de "conto", por uma questão de praticidade mesmo, foi chamado de "novela" pelos autores quando publicados. É o caso de Sagarana. E um conto como "O alienista" desafia os parâmetros do gênero. Osman Lins resolveu a coisa da seguinte forma. Há um livro seu que se chama "Nove novena: narrativas". Sem contar que há uma diferença fundamental entre romance e romance moderno, o que é outro imbróglio. De forma que estou levemente tentada a adotar "narrativa" em vez de tentar diferenciar romance de conto, mantendo o marcador "crônica", que é uma mistura de muita coisa, e também um capítulo à parte na hora de se defrontar com essa coisa chamada literatura. Além do mais, a palavra romance tem uma carga semântica muito alta. Li na adolescência coisas chamadas "romance" que não ousaria postar aqui, a não ser que quisesse ironizar-me. Sem contar que, no imaginário cotidiano, a palavra romance faz parelha com amor. É muita responsabilidade para um pobre signo cuja história, com o perdão da ironia, daria um bom romance. No entanto, o marcador em questão torna-se obrigatório para posts como este, em que se discute, de alguma forma, a questão dos gêneros literários e o próprio romance, ferramenta obrigatória quando o ofício é ensinar literatura, mesmo porque os manuais didáticos não dão muita alternativa, o que já é outra novela. De mais a mais, o marcador "poesia" segue firme e forte, sobre ele não pairam dúvidas, de forma que permanece a questão: como referir o que chamamos de literatura mas não é poesia, estritamente falando?

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