O LEITOR
Quem pode conhecer esse que o rosto
mergulha de si mesmo em outras vidas,
que só o folhear das páginas corridas
alguma vez atalha a contragosto?
A própria mãe já não veria o seu
filho nesse diverso ele que agora,
servo da sombra, lê. Presos à hora,
como sabermos quanto se perdeu
antes que ele soerga o olhar pesado
de tudo o que no livro se contém,
com olhos, que, doando, contravêm
o mundo já completo e acabado:
como crianças que brincam sozinhas
e súbito descobrem algo a esmo;
mas o rosto, refeito em suas linhas,
nunca mais será o mesmo.
RILKE, Rainer Maria. Coisas e anjos de Rilke. Tradução Augusto de Campos. São Paulo: Perspectiva, 2007, p.145.
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