Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


domingo, 26 de junho de 2011

Mário Faustino: um verso rampante


BRASÃO

Nasce do solo sono uma armadilha
Das feras do irreal para as do ser
― Unicórnios investem contra o Rei.

Nasce do solo sono um facho fulvo
Transfigurando a rosa e as armas lúcidas
Do campo de harmonia que plantei.

Nasce do solo sono um sobressalto.
Nasce o guerreiro. A torre. Os amarelos
Corcéis da fuga de ouro que implorei.

E nasce nu do sono um desafio.
Nasce um verso rampante, um brado, um solo
De lira santa e brava ― minha lei

Até que nasça a luz e tome o sonho,
O monstro de aventura que amei.

FAUSTINO, Mário. O homem e sua hora e outros poemas. São Paulo: Companhia de Bolso, 2009, p.65. Imagem obtida aqui.

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