Gosto de imaginar que ilhas significam-se ― fazem-se dizer por signos ― mediante barcos que se aventuram nas águas que as separam, mas também as unem: as águas podem ser oceânicas ou simples veredas, salgadas ou doces, profundas, turbulentas e mais difíceis de navegar, ou arroios cristalinos que escorrem transparentes entre pedras e vegetação de grande frescor. Os barcos, as palavras. E tudo o mais que diz respeito à palavra afeto, no sentido de afetar, atravessar. Escrever e ler são pontas de ilhas que se fazem significar ― os trajetos dependem dos barcos, das ilhas, das águas que as separam. Este blog não pretende nada, exceto lançar barcos que eventualmente alcancem outras ilhas. Barquinhos de papel.


quinta-feira, 30 de junho de 2011

a última imagem desta noite

Uma das últimas imagens desta noite foi uma onda enorme me engolindo ― ou a caminho de, eu também onda, mar, porém menor. A última imagem desta noite é o desenho de um acontecimento que faz tempo tento entender, o que (me) diz mais de minha angústia do que necessariamente de ter entendido. Na última imagem desta noite a própria metáfora, de que por fim tentava fugir, me engolfou: a metáfora do mar, não esta aqui do blog, mas de outra natureza. E eu acordava, no sonho, em um quarto reformado em que não havia mais vestígios ― traços ― do que tentava entender, e que engendrou a metáfora, ou então a metáfora tinha desaparecido, uma vez me engolfado (mais foi isso mesmo?), sem deixar traços. Mas logo constatava o engano, pequenos defeitos no reboco mal acabado, fazendo daquela gigantesca onda uma presença incômoda, com a qual precisaria lidar. O traiçoeiro (enganoso) da metáfora, a última imagem desta noite. E afinal eu acordei, ainda no sonho, então a metáfora não me engolfou.

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